quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Pesca Sustentável Do Pirarucu Beneficia Comunidades Pesqueiras Do Acre

Aumento da renda dos pescadores e maior engajamento da comunidade em prol da conservação do meio ambiente são apenas alguns dos resultados

Captura do pirarucu. Foto: http://www.jmhost.com.br/.
Acre (AC) - Com pouco mais de dois anos de atuação, o projeto Pesca Sustentável tem trazido inúmeros benefícios para comunidades pesqueiras dos municípios de Feijó e Tarauacá, no estado do Acre. A iniciativa tem capacitado pescadores para o desenvolvimento de sistemas de manejo sustentável do pirarucu e implementado esforços para o monitoramento efetivo da espécie rumo à certificação da pesca. Parceria do WWF-Brasil com organizações e grupos locais, o projeto recebe apoio do Fundo Amazônia, gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

O manejo tem sido feito pelos 11 pescadores do projeto, que tem desempenhado atividades, como: contagem dos peixes; apoio em pesquisas de monitoramento do pirarucu; e comercialização do pescado. As ações têm sido realizadas pelo WWF-Brasil e parceiros, como a Secretaria de Extensão Agro-Florestal e Produção Familiar do Estado do Acre (Seaprof/Acre) e a Colônia de Pescadores de Feijó. Além disso, também cooperam com a iniciativa o Instituto de Meio Ambiente do Acre (IMAC) e o Batalhão de Polícia Ambiental (BPA).

Contagem

A contagem, feita nos 19 lagos do projeto em Feijó e em Tarauacá, é importante para quantificar pirarucus jovens e adultos nos locais que possuem acordos de pesca vigentes, e fazer o manejo adaptativo do projeto, considerando também a experiência, a realidade das comunidades locais e os indicadores de conservação da espécie. Para a contagem dos pirarucus, os manejadores utilizam uma metodologia desenvolvida e testada pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM), que se baseia na visualização e no som produzido quando o pirarucu vai à superfície para respirar, a intervalos que variam de 10 a 25 minutos, que os permite localizar e ter uma estimativa do tamanho dos peixes.

Em Feijó, no ano 2015 foram contados 273 pirarucus em 14 lagos. Em 2016, esse número reduziu para 141 indivíduos em oito lagos avaliados. De acordo com Moacyr Silva, gestor do Projeto do WWF-Brasil, neste ano a seca severa ocorrida no rio Envira dificultou chegar nos lagos mais distantes. “Com um período menor de conexão dos lagos ao rio durante a cheia de 2016, não houve tempo hábil para a renovação da água e do processo de limpeza natural dos lagos, que ficaram mais sujos por vegetação superficial. Dessa forma, os peixes não foram localizados de forma efetiva no momento da contagem e acreditamos que isso também influenciou em alguma medida o resultado final da contagem de 2016”, explica.

A partir das dimensões e da forma do lago, os pescadores se distribuem de forma que o local seja monitorado por completo. “Com o registro de cada um deles, a contagem dá uma estimativa da população de pirarucus no lago. O conhecimento prático dos pescadores e suas habilidades na pesca da espécie, combinados com a técnica padronizada, resulta em um método eficiente para estimar a população de pirarucus num sistema de lagos. Essa mesma metodologia tem sido utilizada por diversos projetos de manejo de pirarucu em toda a Amazônia, viabilizando pesquisas e iniciativas manejo sustentável da espécie”, afirma Moacyr.

Em Tarauacá, as contagens de 2015 e 2016 indicaram aumento de 35 para 50 indivíduos nos três lagos onde foi identificado um potencial de manejo do pirarucu.

Durante a safra de 2015, as medidas de monitoramento indicaram uma estabilização e manutenção dos pirarucus nos lagos naturais de Feijó. “O suporte financeiro do Fundo Amazônia tem sido essencial na promoção da melhoria de qualidade de vida de pescadores e comunidades tradicionais. O ano de 2016 foi um importante momento para avançar em diferentes componentes do projeto, seguir a implementação do plano de melhoria da pescaria e promover maior engajamento dos beneficiários no monitoramento dos acordos de pesca aprovados até o momento”, avaliou Charles Guimarães, presidente da Colônia de Pescadores de Feijó.

Foi ainda em 2015 que o manejo da pesca começou a ser implementado nos lagos da terra indígena (TI) Praia do Carapanã, em Tarauacá (AC). Como fruto deste trabalho, foram lançadas uma cartilha e um calendário bilíngues (português-kaxinawá) com o objetivo de orientar o povo Huni Kuin/Kaxinawá sobre as práticas corretas do manejo do pirarucu e como essa prática se insere no calendário anual de produção da comunidade indígena. A publicação se destaca pelas ilustrações que foram elaboradas pelos próprios indígenas da comunidade, durante oficinas realizadas pelo Projeto.

Comercialização

Atualmente, o principal espaço de comercialização do pirarucu é a Feira do Açaí, que acontece todos os anos em Feijó no mês de agosto. Em 2015, foram comercializadas cerca de 1,4 toneladas em Feijó, resultado da pesca de 23 pirarucus, no período de junho a agosto. Neste ano, foram pescados 14 peixes, totalizando 492 kg.

Os valores arrecadados são divididos entre toda a comunidade da seguinte forma: 65% para os manejadores, 20% para a comunidade onde fica o lago manejado e 15% para a Colônia de Pescadores de Feijó. Dados do Projeto mostram que, a partir do trabalho realizado pelo Pesca Sustentável, em 2015 a renda total líquida dos pescadores do grupo aumentou em 14%. Já a receita da Colônia aumentou em 66% e das comunidades em 53%, se comparadas às rendas obtidas desta atividade em 2014.

São beneficiadas diretamente sete comunidades do município de Feijó, incluindo parte da população da etnia Kaxinawá da TI Nova Olinda, além de 25 agentes indígenas de manejo de pirarucu da TI Kaxinawá Praia do Carapanã, no município vizinho de Tarauacá. Os trabalhos envolvem atualmente cerca de 50 pescadores (indígenas e não indígenas) de forma direta e, indiretamente beneficiam cerca de 125 famílias em Feijó e Tarauacá.

Em algumas comunidades o benefício foi revertido para um bem de uso comum, como bebedouro de água e escadaria na beira do rio para facilitar o acesso dos alunos à escola e escoamento da produção; construção de galpão para reuniões comunitárias na aldeia Formoso, entre outros. Outro benefício gerado para as comunidades ribeirinhas é a limpeza periódica dos lagos que o Projeto apoia, feita em conjunto entre o grupo de manejadores e a comunidade, e que tem garantido a esses ribeirinhos um espaço limpo e mais seguro no lago para pesca de subsistência durante o ano inteiro.

Novos desafios



Ainda em 2016, o projeto pretende expandir o manejo do pirarucu para as dez aldeias dessa mesma TI, além de consolidar o grupo de manejadores, fortalecer o monitoramento participativo dos lagos. “A colaboração da Colônia de Pescadores de Feijó e o engajamento dos parceiros e comunidades têm sido fundamental para os resultados obtidos até o momento”, avalia Moacyr.

Segundo ele, ainda em 2015, foi feito o mapeamento de novos lagos para manejo de pirarucu onde foram incluídos mais dois lagos potenciais para 2016 na terra indígena. Além disso, as parcerias do WWF-Brasil com a Colônia de Pescadores de Feijó, com a Associação indígena Huni-Kui, com a Fundação Nacional do Índio (Funai) e com o governo do estado do Acre têm sido fortalecidas por meio das ações do projeto.

“Estamos trabalhando com uma perspectiva de certificação da pescaria no médio prazo. Almejamos alcançar a certificação MSC, ainda pioneira no Brasil para pescaria de água doce em região tropical, como forma de promover e reconhecer o fortalecimento das organizações comunitárias que operam essa cadeia produtiva para que um legado do projeto Pesca Sustentável seja garantido e internalizado na forma de práticas de gestão e instrumentos normativos”, acredita.

Outro objetivo para 2016 é ampliar o número de lagos com acordos de pesca aprovados e prosseguir na identificação de novos com potencial de manejo do pirarucu. “Queremos melhorar a percepção das comunidades ribeirinhas dos benefícios que o projeto gera e o potencial que o projeto gera de renda para eles, além de promover maior integração entre consultores e parceiros e procurar estar mais próximos das comunidades”, afirma.

Colaboração de Frederico Brandão, Programa Amazônia / WWF-Brasil, in EcoDebate, 26/10/2016.


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